Instalação


ATA DA CERIMÔNIA DE POSSE

DOS MEMBROS DA ACADEMIA DE LETRAS DE ITABUNA ‒ ALITA

Fragmentos




Professor Rui Póvoas

"Fosse eu, este escriba que dá conta das acontecências da posse da ALITA, um Gonçalves Dias, diria: “Meninos, eu vi!” Foi no dia cinco de setembro do ano de dois mil e onze. Girava, por aí, em torno das vinte horas. Pessoas da sociedade grapiúna se congraçavam, num alegre vozerio. Senhoras vestidas a rigor, as confreiras a serem empossadas desfilavam elegância nos matizes das vestes negras. Estávamos no auditório da Faculdade de Tecnologia e Ciências, nesta nossa cidade de Itabuna e a promessa era de um momento, no mínimo, elegante e de espírito elevado. Seria, como terminou sendo, uma noite cravejada de brilhos da Literatura. Uma voz se elevou entre as demais: era Valério Magalhães, o mestre de cerimônia. Saudou aos presentes, disse do objetivo daquela cerimônia que já se iniciava, ao tempo em que convidou os membros da ALITA a adentrar o recinto. Estávamos na ante-sala, para onde tínhamos nos recolhido sorrateiramente, sem que os convidados dessem por isso. Entramos jubilosos, sorridentes e radiosos. Todo o auditório, já repleto a essas alturas, nos acolheu de pé. Uma saraivada de relâmpagos de flashes se abateu sobre nós. Estávamos sendo fotografados para a Memória dos que virão após nós. Tomamos assento nas cadeiras numeradas da fila da frente, correspondentes às Cadeiras que ocupamos na ALITA: Antônio Laranjeira Barbosa, Antônio Lopes da Silva, Ary Quadros Teixeira, Carlos Eduardo Lima Passos da Silva, Carlos Válder do Nascimento, Ceres Marylise Rebouças de Souza, Cyro Pereira de Mattos, Dinalva Melo do Nascimento, Gustavo Fernando Veloso Menezes, Janete Ruiz de Macedo, Luiz Antonio dos Santos Bezerra, Lurdes Bertol Rocha, Marcos Antônio Santos Bandeira, Marialda Jovita Silveira, Maria Luiza Nora de Andrade, Maria Palma Andrade, Renato de Oliveira Prata, Rilvan Batista de Santana, Ruy do Carmo Póvoas, Sione Maria Porto de Oliveira e Sônia Carvalho de Almeida Maron, sendo esses fundadores e efetivos. Também estavam presentes dois membros correspondentes: Roberto Sidney Macedo e o próprio Aramis Ribeiro Costa, também presidente da Academia de Letras da Bahia, vindo a nosso convite para empossar o presidente da ALITA. Diga-se também que sentimos a ausência daqueles e daquelas que, por motivos pessoais ou por compromissos assumidos anteriormente, deixaram de comparecer.



"E retomando o fio do desenrolar da cerimônia de posse, Valério Magalhães, o mestre de cerimônia, continuou o seu trabalho, desta vez para compor a mesa solene. Primeiro, ele convidou Aramis Ribeiro Costa, presidente da Academia de Letras da Bahia, vindo com a missão especial de empossar o ilustre confrade Marcos Antonio Santos Bandeira no cargo de Presidente da ALITA. Este foi o segundo a ser chamado. A mesa foi composta, ainda, por Andirlei Nascimento (presidente da Ordem dos Advogados do Brasil ‒ seção Itabuna), Cristiano Lobo (diretor da Faculdade de Tecnologia e Ciências ‒ Itabuna), Josanne Francisca Morais Araújo (Comitê Científico da UESC), Adélia Maria Pinheiro (vice-reitora da Universidade Estadual de Santa Cruz ‒ UESC), Eliane Sabóia Ribeiro (Academia de Letras de Ilhéus e a Professora Rita Fontes (Lyons). Seguidamente, houve um momento de hinário. O Hino Nacional foi cantado com efusividade, mas na execução do Hino de Itabuna, mal se ouvia uma voz ou outra, apesar de a letra do hino ser projetada numa tela. É tempo, então, de se perguntar: “O que há entre o Hino de Itabuna e os cidadãos e cidadãs itabunenses?” Estávamos todos e todas de pé e após a execução dos hinos tornamos a nos sentar, após uma salva de palmas calorosas. O mestre de cerimônia convidou, então, o ilustre acadêmico Antônio Lopes para proferir a saudação ao ilustre visitante Aramis Ribeiro Costa. E assim, ele se pronunciou:


Ilustres componentes da mesa,

Senhoras e senhores convidados,

Ilustres confrades e confreiras da ALITA,

Senhor presidente da Academia de Letras da Bahia, Aramis Ribeiro Costa:

Um escritor não vale pelo que é, mas pelo que faz. Não conta o produtor, conta o produto. Eça de Queiroz, que vossa senhoria confessa ser dos seus autores preferidos, quando era instado a falar de si, dizia com certo enfado não ter história: “Quem quiser saber de mim – salientava o autor de A cidade e as serras –leia os meus livros”.

No Brasil, muitos seguiram este modelo: talvez seja o caso de Raduan Nassar, Dalton Trevisan, Rubem Fonseca e outros que não gostam de expor sua vida pessoal e preferem guardar distância de plumas, paetês, confetes, serpentinas e lantejoulas.

Logo, senhor Aramis Ribeiro Costa, esta novel casa de cultura – que saúda vossa senhoria por um dos seus mais humildes integrantes – pede licença para, ainda que a voo de pássaro, estender o olhar – neste dia histórico para as letras de Itabuna – menos ao presidente da Academia de Letras da Bahia e mais ao poeta, romancista, contista e novelista de amplos recursos que nos concede a honra da visita."

"Sua temática é a cidade da Bahia, a velha Bahia das tradições, mas também a nova Bahia das aspirações contemporâneas. É notável como obra e autor se fundem e se confundem numa simbiose aparentemente contraditória de velho e novo: o estilo de Aramis Ribeiro Costa combina o formato clássico, com remessa a mestres renomados como Tchekov, mas sempre com um pé, às vezes os dois, na modernidade."

"Senhor Aramis Ribeiro Costa, o senhor, felizmente, escapou da indiferença cruel a que muitos criadores foram condenados sem julgamento. E nesta Casa o senhor é mais conhecido do que imagina, senão vejamos, primeiro as damas: a confreira Maria Luiza de Andrade Nora ficou encantada com as histórias de Contos Reunidos, à frente de qual publicação ela esteve, como diretora da Editus/Editora da UFSC; o confrade Hélio Pólvora entusiasmou-se com A Assinatura Perdida. “Aleluia! Ainda se escrevem contos que são contos. O conto que se exprime pela linguagem e pelos significados recolhidos. O conto na tradição dos clássicos, mas tocado pelo espírito da modernidade”.

E o confrade Cyro de Mattos, que tem Aramis Ribeiro Costa na alta conta de “escritor competente, verdadeiro e ético”, o antologiou (que o professor Ruy Póvoas não me puxe as orelhas por este neologismo) no livro “O conto em vinte e cinco baianos”.

Aliás, creio que houve muita felicidade na escolha de “Dez Anos Depois” para a antologia. O bom humor com que a narrativa se inicia segue o modelo de aberturar, abufelar o leitor e conduzi-lo ao fim do texto."

"Creio que já abuso da bondade dos convidados e da rigidez do protocolo, mas lhes rogo por uns poucos instantes, sem o que cometeria a injustiça de, sequer a vol d´oiseau, aquele voo de pássaro dos franceses, mencionar o poeta em Aramis Ribeiro Costa. O Soneto do sol da madrugada me impressiona, me emociona, me toca o coração."

Soneto do sol da madrugada, nas mãos de um Antônio Cândido, viraria aula, palestra ou conferência. Mas não se engane, senhor Aramis Ribeiro Costa, nosso convidado ilustre: nesta casa há nomes que fariam a exegese de Soneto do sol da madrugada, em toda sua inteireza poética. Afinal de contas, o chão que produziu Jorge Amado, Telmo Padilha, Euclides Neto, Jorge Medauar, Valdelice Soares Pinheiro, Sosígenes Costa e Adonias Filho – patrono da ALITA – é o mesmo que abriga analistas do porte de Margarida Fahel, Jorge de Souza Araujo, Baísa Nora, Cyro de Mattos,  Ruy Póvoas, Tica Simões, Hélio Pólvora e outros, assentados nesta Casa  e capacitados à exegese do vosso soneto."

"Senhor escritor Aramis Ribeiro Costa, presidente da Academia de Letras da Bahia, considere que, simbolicamente, lhe foi estendido aquele tapete vermelho da nossa imaginação e da nossa cortesia. O presidente Marco Bandeira me manda dizer, em nome de todos os confrades e confreiras, que considere sua esta ainda tão modesta Casa, a Academia de Letras de Itabuna. Seja bem-vindo. Muito obrigado."
 
Após a saudação pronunciada por Lopes, o mestre de cerimônia convidou Aramis Ribeiro Costa, Presidente da Academia de Letras da Bahia, para seu pronunciamento, seguido do empossamento do ilustre acadêmico Dr. Marcos Antônio Santos Bandeira na presidência da ALITA.  


"Senhores Fundadores da Academia de Letras de Itabuna:

Precisaríamos ir muito longe, uma excursão no espaço e no tempo, para encontrarmos as vertentes históricas desta solenidade que nos reúne para a fundação de uma nova academia de letras. Teríamos, antes de tudo, de percorrer vagarosamente os jardins que abrigavam o túmulo do herói ático Academo, às margens do Rio Cefiso, próximo de Atenas, nos quais Platão dialogava com seus peripatéticos discípulos, a perquirir questões do saber, nas tardes ensolaradas da Grécia esplêndida. E depois, quase quatro séculos atrás, transportando-nos de um momento luminoso da humanidade a outro, visitar a academia de Richelieu, nos tempos gloriosos da França de Luís XIII.

Não era a primeira academia dos tempos modernos. O poderoso cardeal e primeiro-ministro, com sua Académie Française, praticamente dava continuidade a duas outras, ambas criadas em Paris: a Académie de Poésie et de Musique, em 1570, e a Académie du Palais, em 1576, esta última para cuidar da língua e da literatura francesas. E houvera também, na Itália, entre 1582 e 1583, certa Accademia della Crusca, instituída por cinco florentinos para proteger e purificar o idioma italiano. Mas a iniciativa do Cardeal de Richelieu em 1635 seria tão importante e tão prestigiosa que passaria a inspirar as demais academias de letras, sempre com o objetivo de cultuar a língua e a literatura, além de definir o vocabulário.

Só após essas duas visitas, à Grécia de Platão e à França de Richelieu, é que voltaríamos ao Brasil, onde a inspiração da Académie Française foi decisiva para o sodalício que Machado, o admirável Bruxo do Cosme Velho, fundaria com seus ilustres pares no ofício de escrever e amar a cultura.

Era no apagar das luzes do século XIX, na Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, porém capital da República e referência cultural da nação brasileira. Fundada em 1897, quando a humanidade jamais poderia vislumbrar, nem mesmo com a exorbitante imaginação de um Jules Verne, os maravilhosos avanços da ciência e da tecnologia do século seguinte, a Academia Brasileira de Letras, longe de apagar-se no obsoletismo e no desprestígio, cresceu em importância e consideração, a ponto de tornar-se um objetivo glorioso dos que aspiram à imortalidade literária no Brasil."

"A data de fundação da Academia de Letras da Bahia, 7 de março de 1917, não foi um acaso, porém propositadamente escolhida para lembrar a Academia Brasílica dos Esquecidos. Isso levou o quase perpétuo presidente da Academia Brasileira de Letras, Austregésilo de Athayde, que via na concordância das datas de fundação um propósito de continuidade, a nos recomendar que inscrevêssemos no brasão de nosso sodalício: “Primeira Academia de Letras do Brasil”. Não o fizemos, não o faríamos, preferindo a recomendação histórica e altamente louvável de nossos fundadores: “Servir à Pátria honrando as Letras”. E não fazemos mal, quando também honramos a Pátria, servindo às letras.

É justamente o que me parece tenham se transformado as modernas academias de letras, a começar pela nossa, a Academia de Letras da Bahia, uma instituição permanentemente a serviço das letras. A velha concepção de uma agremiação fechada, a reunir quase secretamente quarenta idosos acadêmicos, que entre um gole de chá e uma fatia de bolo discutem a chave de um soneto, ficou definitivamente no passado, se é que, em algum lugar e em alguma época, alguma academia de homens de letras tenha se resumido a tão inúteis reuniões. O fato é que, hoje, não se pode conceber uma academia de letras que não seja um núcleo disseminador de cultura, aberto ao público e muitas vezes voltado para esse público."

"Então, senhores fundadores da Academia de Letras de Itabuna, o que fazeis nesta noite solene, e esperamos todos que de fato assim seja, é inaugurar não uma agremiação reservada aos seus eleitos, mas instituir, por meio de vosso compromisso acadêmico, um poderoso instrumento de disseminação das letras, da literatura e da cultura em seu sentido mais amplo, a favorecer não apenas a vossa encantadora cidade de Itabuna, mas toda a vossa ampla, bela e fecunda Região do Cacau, a beneficiar a própria Bahia e o próprio Brasil, já tão enriquecidos ambos por vossa preciosíssima literatura."

A vossa academia — se me permitis, a nossa academia, já que me concedeis o privilégio e a honra de me tornar vosso membro correspondente — herda a tradição de uma literatura poderosa, tão poderosa que valeria, ela isolada, por toda uma literatura nacional. Bem mais que pelo poder econômico do cacau, tantas vezes assolado pela devastadora praga da vassoura-de-bruxa, terá sido a força impressionante e a excepcional qualidade da vossa literatura a inspirar Adonias a proclamar estas terras sul-baianas de Nação Grapiúna. Cedesse eu, neste momento, à tentação de citar, um por um, todos os grandes escritores e poetas, mortos e vivos, que nasceram nestas terras cacaueiras do Sul da Bahia, os chamados grapiúnas, e certamente transformaria estas breves palavras de abertura de vossa solenidade, numa interminável proclamação de nomes notáveis. Permiti-me, entretanto, citar apenas quatro dos que partiram e jamais partirão, e que se encontram entre os patronos desta nova academia: o próprio Adonias Filho, Jorge Amado, Sosígenes Costa e Jorge Medauar. Por meio deles, homenageio todos os outros, inclusive e principalmente os que estão vivos e produtivos, a nos surpreender a cada instante com o vigor do seu talento. Permiti também, e eu o reivindico como um favor pessoal, que eu agradeça à minha editora e amiga Maria Luiza Nora, e ao meu amigo e confrade, poeta e escritor Cyro de Mattos, e por extensão a todos vós por vossa generosa concordância, o privilégio do título que esta noite me é concedido.

Ditas estas palavras, só me resta vos desejar que vosso Rio Cachoeira vos inspire, como inspirava o Rio Cefiso a Platão e seus discípulos, e que possais realizar com vossa academia, com nossa academia, todos os altos desígnios que honram a vossa tradição literária."

Ao término desse pronunciamento, o acadêmico Marcos Bandeira dirigiu-se ao púlpito onde estava o Presidente Aramis que assim se expressou: “Declaro empossado na presidência da Academia de Letras de Itabuna ‒ o ilustre acadêmico Marcos Antonio Santos Bandeira, para que se cumpram todos seus efeitos legais.” E o auditório inteiro explodiu em demorada salva de palmas. Aramis retomou seu lugar à mesa e o agora Presidente Bandeira assim se pronunciou:


"Gostaria, antes de qualquer incursão, de agradecer a distinção com que fui agraciado pela escolha de meu nome para presidir os destinos desta importante instituição de homens e mulheres de letras, no seio da qual, certamente, outros, por méritos próprios, galgariam com maior justeza tamanha honraria. Sinto-me profundamente honrado e ao mesmo tempo preocupado com as graves responsabilidades do cargo, principalmente porque a Academia de Letras de Itabuna já nasce grandiosa pela qualidade indiscutível de seus confrades e confreiras, e reconheço minhas limitações pessoais para enfrentar tal desafio."

"A Academia de Letras de Itabuna foi fundada no dia 19 de abril de 2011, nas dependências da Fundação Itabunense de Cultura e Cidadania de Itabuna, numa aspiração genuína de 08 homens e 07 mulheres em criar, em Itabuna, um centro referencial de cultura, a exemplo do que já ocorrera em Ilhéus, cuja academia foi fundada em 1959. Nascia ali, naquela manhã de abril ‒ dia do índio ‒, de forma tão natural como o canto de um guriatã, a Academia de Letras de Itabuna, inspirada no modelo da academia francesa, formada por homens devotados às letras e as ciências humanas, mas voltada precipuamente para a dignidade da pessoa humana e sua capacidade infinita de construir conhecimentos nas áreas da literatura e das ciências humanas."

"Por que nossa co-irmã Ilhéus possui uma academia de letras desde 1959, em cujo corpo acadêmico estão muitos itabunenses, e Itabuna, com uma plêiade de mulheres e homens devotados às Letras não poderia ter sua própria academia? Essas indagações e perguntas passaram a ser compartilhadas com o escritor Cyro de Matos que, nesse processo de construção da ALITA, foi o nosso grande timoneiro e líder. Ele, escritor reconhecido em outros países também, com vários de seus livros traduzidos em outros idiomas, pertencente a várias academias de letras, inclusive a Academia de Letras da Bahia e à Academia de Letras de Ilhéus, queria, no fundo de sua alma de poeta, pertencer à academia de letras de sua querida Itabuna, cenário mágico e inspirador para suas prosas e poesias que atravessaram a fronteira do Brasil. E assim, do verbo se fez a vida, e assim nasceu a Academia de Letras de Itabuna."

"A nossa Academia tem como patrono o grande escritor Adonias Filho, que ocupou por muito tempo a cadeira nº 21 da Academia Brasileira de Letras, e que deixou um legado precioso para todos nós, como grande romancista e crítico literário, sendo um dos principais responsáveis pela riqueza cultural da nação grapiúna. Ele também nasceu no mês de novembro, precisamente no dia 27, dia que encerra simbolicamente as atividades acadêmicas da ALITA. A nossa Academia, seguindo a tradição da Academia Francesa e da Brasileira, é composta de 40 membros efetivos e respectivos patronos, além de membros correspondentes e honorários. A Revista da ALITA chamar-se-á Guriatã, em homenagem ao pássaro que leva as cores de Itabuna e que é muito conhecido por imitar o canto de outros pássaros."

Desta forma, e com a verve do bom sertanejo que não foge do seu destino e enfrenta todos os desafio que o Criador coloca na sua frente, espero, com o auxílio inestimável dos ilustres confrades e confreiras, presidir esta Instituição com a serenidade inspirada nos espíritos superiores de todos os seus membros e embalado pelos ventos da sã democracia, de sorte a empreender esforços para a elevação da cultura regional em todas as suas manifestações, independentemente de preferências políticas, religiosas ou filosóficas, voltados única e exclusivamentepara o bom debate no saudável campo das idéias e da elevação do saber, além do convívio fraterno entre os confrades e as confreiras. Finalmente, quero agradecer a todos os familiares e amigos, especialmente a minha esposa, Rosana, pelo apoio , compreensão e estímulo.

Muito Obrigado!"

O mestre de cerimônia Valério Magalhães convidou a ilustre acadêmica Ceres Marylise Rebouças de Souza para a leitura da relação dos confrades e confreiras que tomam posse na ALITA, nesta data.


Ceres Marylise retornou ao seu lugar, enquanto o mestre de cerimônia anunciava a ilustre confrade Sônia Carvalho de Almeida Maron, que haveria de pronunciar o juramento.


Prometo promover, quanto a mim couber, o engrandecimento da Academia de Letras de Itabuna, ALITA, trabalhar pela Literatura e pela Arte da Região Sul da Bahia e cumprir fielmente seus Estatutos e o Regimento Interno.

O Presidente Bandeira conclamou um representante de cada categoria de membros da ALITA, para assinarem simbolicamente o termo de posse. Assim, foram chamados os ilustres acadêmicos: Sione Maria Porto de Oliveira (membro fundador); Janete Ruiz de Macedo (membro efetivo) e Aramis Ribeiro Costa (membro correspondente). E os três assim procederam, assinando no livro destinado para tal fim.

Em seguida, o mestre de cerimônia anunciou a fala do ilustre acadêmico Ruy do Carmo Póvoas, para proferir leitura de um fragmento literário da autoria do escritor Adonias Filho, patrono da ALITA. E Assim Ruy Póvoas se pronunciou:


Ilustres Senhoras e Senhores componentes da mesa


Senhoras e Senhores convidados


Sejamos todos bem vindos com a graça de Deus


A Academia de Letras de Itabuna instala-se hoje, aqui e agora, tendo como patrono o escritor Adonias Filho. Senhor das Letras, Adonias nos deixou uma vasta obra literária que ultrapassou as fronteiras grapiunas e ganhou o mundo. Estivesse ele aqui, hoje, conosco, certamente teria ensinamentos para nos dar. Ainda que desde dois de agosto de 1990, ele tenha nos deixado, basta que leiamos alguma página de seu legado, e ele estará falando conosco novamente. Então, permitam que, pela minha voz, na leitura de um fragmento de uma de suas obras literárias, o nosso patrono se manifeste nesta noite de júbilo.

Tenho aqui, comigo, um de seus romances, As velhas, publicado pela Editora Civilização Brasileira, em 1975. Leiamos a página 42 do referido romance:

Compraram os cavalos e, como tinham que entrar no arruado para fazer a feira, Paulão Paturi pediu a Odílio que os mantivesse ali até a manhã seguinte. Dormiriam em Almadina e os levariam pela madrugada. E para a conversa, saindo da palhoça, foram chegando os Pratibus. Não, não eram muitos! Odílio e a mulher, o cunhado que do nome já não me lembro, um magrelão chamado Vicente e o mocinho Quintino que, pela cara, devia ter uns vinte anos. Os homens, que pareciam esperar qualquer encrenca, não largavam as armas um só minuto. E por isso mesmo, porque não tinham como largar os rifles e os punhais, ali estavam alojados fora do arruado.

‒ Há um barraco vazio ‒ Odílio disse, convidando ‒ e vosmecês podem dormir aqui.

A coisa aconteceu naquele momento. Os Paturis não iam voltar para dormir mas, quando já recusava o convite, Chico Paturi viu a moça. Vinha do rio, pote na cabeça, alpercata nos pés, saia de chita e cabelos soltos. Redondos e pequenos os seios. Olhos cor de pólvora e a pele morena acentuavam certa beleza. Baixinha, porém, pouco mais de um metro. Pôs o pote no chão, aproximou-se e, porque ria, ao homem pareceu alegre.

‒ É Zefa, minha filha ‒ Odílio apresentou.

‒ Voltaremos para dormir ‒ Chico Paturi decidiu.

Todas as pessoas têm a sua sina, todas, isso eu digo e juro. A moça demorasse mais dois minutos no rio e tudo teria sido diferente. Chegou no instante marcado como se aquele encontro estivesse resolvido desde que nasceram. As sinas dele e dela mandaram que se vissem naquela manhã de sábado, um gostando do outro, quanto o homem quanto a mulher aguardando a noite com ansiedade. Força misteriosa acompanha o que tem de acontecer. (Grifos meus)


A força misteriosa a que Adonias se refere tem muitas denominações. Os religiosos chamam-na “Desígnio do Altíssimo”; os incrédulos, “acaso”; a maioria das pessoas a identifica como “destino”. Os fieis do candomblé dizem tratar-se do “odu”, isto é, “caminho a ser seguido”. Os mais sofisticados dizem que é mera coincidência, isto é, “pseudônimo de Deus, quando ele não quer assinar”.

Seja como for, trata-se de força. E como quer Adonias Filho, ela é “misteriosa”. Essa força nos trouxe a todos nós até aqui, nesta noite em que nos juntamos para uma ação de elevado espírito. É justamente dessa força misteriosa que precisamos lançar mão, pois a sociedade grapiuna vive tempos de medo. Já não podemos mais sair às ruas para um passeio depois que o sol se põe. Estamos proibidos de ver a lua cheia refletida nas águas do Cachoeira. Enquanto isso, o marginal pode gozar da liberdade de ir e vir a qualquer hora da noite. Transformamos nossas casas e apartamentos em cadeias particulares, com grades possantes, câmeras acopladas a sistemas de TV, cercas elétricas, seguranças musculosos e cães furiosos. Nas nossas garagens, dormem carros suntuosos, enquanto pessoas desamparadas pernoitam sob marquises, árvores e viadutos. E no engano dessa falsa segurança, vamo-nos acostumando aos padecimentos da desistência.

Hoje, no entanto, nós nos juntamos em torno de homens e mulheres que se associam numa Academia de Letras. Salvamos o nosso sábado. Sinal de que ainda há esperanças para esta nossa sociedade encolhida sobre si mesma, com medo da violência. E é Adonias Filho que nos ensina: Força misteriosa acompanha o que tem de acontecer.

Aos convidados e convidadas aqui presentes, nossos sinceros agradecimentos.

Enquanto o acadêmico Ruy Póvoas, sob intenso aplauso, retornava a seu lugar, o Presidente Bandeira, convidava os membros da primeira diretoria eleita da ALITA para tomarem posse em seu cargos. Assim, um(a) a um(a) foram chamados e subiram ao palco onde se situava a mesa diretora dos trabalhos e assinaram o livro destinado para tal fim, cujo termo estava assim lavrado:




Finda essa etapa, o mestre de cerimônia anunciou o ilustre confrade Cyro Pereira de Mattos, para se pronunciar em nome de todos os membros da ALITA. Vale anotar que, nesta solenidade, Cyro de Mattos também estava representando familiares do escritor Adonias Filho, Patrono da ALITA.

Então, o ilustre acadêmico Cyro de Mattos assim se pronunciou:


"Ilustríssimo Senhor Presidente da Academia de Letras da Bahia, escritor Aramis Ribeiro Costa, Excelentíssimo Senhor Presidente da Academia de Letras de Itabuna, Dr. Marcos Bandeira, ilustríssimas autoridades presentes ou aqui representadas, meus senhores, minhas senhoras.

Começo fazendo dois registros. O alegre vem do  presidente da Academia de Letras da Bahia, escritor Aramis Ribeiro Costa, para  quem  o  jornalista e cronista Antonio Lopes já teceu as merecidas referências e homenagens."
 
"O registro triste vem do escritor, tradutor e jornalista Marcos Santarrita. Pertenceu à minha geração, em Salvador, naqueles idos de 1959 a 1964,  juntamente com o Alberto Silva, Carlos Falck,   Adelmo Oliveira, Fernando Batinga, Ildásio Tavares, Oleone Coelho Fontes, Maria da Conceição Paranhos e  Ricardo Cruz, entre outros.   No final de cada semana, lá estavam alguns desses companheiros em algum bar, na  Rua da Ajuda,  para,  entre goles de cerveja e muita conversa, percorrermos   os jardins quentes da noite. Falava-se e discutia-se sobre Kafka, Sartre, Brecht, Proust,  Joyce, Faulkner, Camus. Machado de Assis, Clarice Lispector, Guimarães Rosa,  Graciliano Ramos, Autran Dourado, Aníbal Machado, Lúcio Cardoso, Lima Barreto, Adonias Filho, Jorge Amado. Maiacowsky, Fernando Pessoa, Mario de Sá Carneiro,  Carlos Drummond de Andrade. Garcia Lorca, Robert Frost. Aristóteles, Carlos Bousoño, Dámaso Alonso, Kurtius, Oto Maria Carpeaux. Marx, Garaudy, Lukacs.   Ficávamos inflamados quando comentávamos algum livro desses grandes escritores." " Cada um de nós depois tomou o seu rumo, empreendeu o seu vôo nos caminhos da vida."

"Marcos Santarrita foi para o Rio de Janeiro, aos 25 anos de idade, lá sobreviveria como jornalista e tradutor, sem esquecer seu sonho maior, que pulsava dentro dele  como desejo flamejante. Tornou-se tradutor de grandes escritores,  redator de jornais importantes como Última Hora e Jornal do Brasil. E estreou com as novelas de A Solidão dos Homens, livro que teve o prefácio de Adonias Filho. Enfrentando os instantes da chuva, nos dias adversos da cidade grande,  persistiu na construção de uma obra pujante no corpo das letras brasileiras. E conseguiu. Cresceu, amadureceu, impeliu-se com talento e sensibilidade para ser de fato um  romancista expressivo, que elaborou seu discurso, de livro para livro, com o foco na ossatura histórica, social e existencial dos que carregam duros conflitos em seu estar no mundo."

"Programaram-me para que eu, representando os membros da ALITA, falasse acerca da importância dessa academia de letras, que ora está nascendo.  Não deviam fazer isso. Eu não queria. A solenidade ficaria cansativa. Além disso,  sempre gostei  de ouvir quem sabe proferir o discurso com a palavra oral, sábia,  sonora e castiça. Ouvir para aprender. E sempre me senti à vontade com a palavra escrita.  Foi com a palavra escrita que, bem ou mal, cheguei até aqui. Lembro, nesse momento, que meu personagem Tidoramim, da narrativa Os Brabos, começa seu monólogo assim: “Você veja, Capivari, se o Pai Grande botou a gente nesse conforme duma boca e dois ouvidos é pra menos falar e muito mais ouvir. E sendo assim eu mesmo me bendigo: sou de menos falar, menos palavrar, menos discutir. Sou de mais olhar, mais ouvir, mais pensar, mais sonhar, mais sentir”.  Tidoramim é uma criatura inocente, ensimesmada,  acha que a vida é melhor e intensa para quem a lê em silêncio. Nasceu no campo, cresceu e aprendeu a se comunicar com os seres e as coisas ouvindo  a linguagem dos pássaros  e dos bichos."

Meus senhores, minhas senhoras.

É preciso compreender a criatura humana com a sua índole introspectiva e não confundi-la com o pedante. É preciso não ser leviano e compreender o ser humano em sua loucura lúcida, não concebê-lo como um bicho diferente, perigoso sonhador, um caso sem jeito, não faz nada de proveito real, trata-se de um rancoroso, inconseqüente ameaçador do sistema. É preciso  amar as pessoas como elas são e o que têm a nos dizer quando saem de dentro de si com os sentimentos puros e verdadeiros. Aparentemente todos nós somos iguais, mas cada qual dentro de si carrega uma  fera ou um anjo, raramente. Cada cidade, que se quer civilizada, precisa reconhecer e estimar seus homens de letras, seus escritores, seus poetas, seus artistas. Beber o  suco melhor de sua inteligência.  Porque o que vale mesmo não é a casca, o verniz,  que simula os artifícios e as mazelas, transmite sem esforço a corrupção e a mentira. O que vale é a verdade com sua ética, que nos alimenta de humanidades sem as fronteiras do preconceito, E nos impinge o sentido rico da existência. E nos devolve aquilo que é próprio de nós mesmos: braço ao abraço feito de compreensão e sentimento. 

Nessas circunstâncias sempre me perguntei o que é uma academia de letras? Para que serve? Todo intelectual para que seja completo deve ingressar em uma academia de letras?  Para que então se sinta realizado como um ente que pensa e sente? O poeta Carlos Drummond de Andrade resistiu durantes anos aos assédios do presidente Austragésilo de Athayde para que ele fosse membro da Academia Brasileira de Letras. O trivial lírico de Itabira não suportava falar nesse assunto. Já outro poeta maior, pleno de ternura e mansidão porque acreditava na existência das flores como meio para inaugurar novos sentidos na permanente paixão da vida, o gaúcho Mário Quintana, tentou várias vezes ingressar na Academia Brasileira  de Letras e sempre foi derrotado. Certa vez um jornalista perguntou-lhe por que insistia tanto em ser membro da Academia Brasileira de Letras quando na verdade ela era que precisava dele e de sua obra para se tornar mais rica.  Ele respondeu com esses versos: Eu sou passarinho/ Enquanto os outros passarão."

"Quando fui receber o Grande Prêmio  da Associação Paulista dos Críticos de Artes, em São Paulo, no Memorial da América Latina, em 1992, por meu livro O Menino Camelô, conheci Rachel de Queiroz, que naquela oportunidade iria receber a mesma láurea por seu monumental romance Memorial de Maria Moura. Aproximei-me dela e disse que era de Itabuna, cidade onde ela havia passado  os primeiros anos de casada. Estava feliz por conhecê-la. Quando adolescente, havia lido seus romances O Quinze, Caminho de Pedras e As Três Marias, disse. Seu ingresso na Academia Brasileira de Letras, como a primeira mulher que rompia as barreiras do preconceito de uma instituição cultural rígida, deixava centenas de brasileiros sorrindo de contente e, em especial, as mulheres. Ela observou que não acreditava nisso de legado e de imortalidade em academia de letras. A gente aparece e desaparece, fica tudo na poeira do tempo, muita coisa acontece por acaso como num lance de dados, porque tem de acontecer, completou."

Meus senhores, minhas senhoras.

Uma academia de letras tem por objetivo o cultivo da língua e da literatura nacionais, em suas relações com as artes e as ciências humanas consideradas como ideais." 

"Em um mundo em que os valores espirituais cada vez mais se tornam descartáveis, os valores materiais tomam conta de tudo, as gerações correm e voam numa automação incrível, que nos deixa estarrecidos,  cabem às  Academias de Letras cultivar como nunca a importância da língua,  da literatura e da comunicação, como manifestações  inerentes aos  seres humanos no elogio da vida. Por isso mesmo é que, através de atividades múltiplas, literárias, artísticas e culturais, podemos dizer que hoje perenizam àqueles que as personalizam quando então usam os sinais visíveis da escrita e  da oratória como instrumentos úteis para a compreensão da existência. Mas isso só se faz real, eficaz e abrangente,  duradouro e  de alcance maior na vida, se houver nas suas atividades e projetos  a parceria dos setores importantes da sociedade.

Como tudo na vida, uma academia de letras precisa de recursos para sobreviver com dignidade. Executar com seriedade e trabalho suas atividades e projetos. Necessita da ajuda positiva das pessoas, da sociedade,  dos setores empresariais, dos poderes legislativo e  executivo do nosso município. Ela será sempre trôpega se depender apenas do esforço e do idealismo de alguns membros abnegados." É preciso que no orçamento do  legislativo e do executivo exista uma cota ideal, decente,   para ajudar a nossa academia de letras,  que agora está nascendo com o propósito firme de levar o bem literário e cultural para os outros, os que fazem essa comunidade ser progressista."

No final de suas palavras, o ilustre acadêmico teceu agradecimentos aos convidados, pela presença e participação. Tão logo Cyro calou-se, o Presidente Bandeira se pronunciou, agradecendo a todos os presentes, ao tempo que dirigiu convite a todos os presentes para o coquetel que aconteceria no salão ao lado do auditório. Feito isso, e como nada mais houvesse a ser tratado ou a acontecer, o ilustre acadêmico Marcos Bandeira deu por encerrada a cerimônia de posse da ALITA. Ao terminar este registro, procedo como comecei: “Meninos, eu vi!” Por isso, para constar como testemunho e memória, na condição de secretário ad hoc, eu, Ruy do Carmo Póvoas, fixei esses apontamentos sob forma de ata. Se do exame posterior que deste texto fizerem os demais acadêmicos e acadêmicas e nele acharem conformidade nos termos, hão de apor suas assinaturas. Itabuna, 5 de novembro de 2011.